O que separa estes dois candidatos de esquerda apoiados pelo Bloco e pelo Livre? À primeira vista, a Europa. Ou talvez nem tanto. Quanto a uma eventual desistência para concentrar a esquerda numa única candidatura — a de António José Seguro —, a resposta é, para já, negativa. Pelo caminho, surgem críticas a Seguro, descrito como próximo de Marques Mendes e com posições pouco claras. No essencial, foi um debate com mais convergências do que divergências. Como esperado.
A primeira pergunta era exatamente que apontassem duas diferenças entre as candidaturas. Catarina Martins recusou fazê-lo, preferindo falar da sua candidatura, mas deixou uma alfinetada ao sublinhar percursos distintos e a sua “experiência de criar pontes”. Jorge Pinto foi direto ao ponto que, para si, separa Bloco e Livre: a Europa. “Sou europeísta, um europeísta crítico, mas europeísta. Com Trump de um lado e Putin do outro, este é o momento de nos afirmarmos.”
Catarina respondeu dizendo que, afinal, sempre defendeu os valores europeus e que as suas críticas serviram para proteger Portugal, lembrando que “houve uma altura em que a UE se preparava para sancionar Portugal”. Jorge Pinto errou ao colar o Bloco a um “Brexit”, com Catarina a corrigir que se tratava apenas de um referendo sobre o tratado orçamental. O tema da Comunidade Europeia de Defesa ficou em aberto, com Catarina a defender apenas maior autonomia europeia face aos EUA.
Sobre uma eventual desistência, nenhum foi definitivo. Jorge Pinto afastou a lógica do voto útil, dizendo que “a principal razão para votar não pode ser quem está melhor nas sondagens” e recuperou um argumento de Seguro: “é um perigo para o país pormos os ovos todos no mesmo cesto”. Catarina Martins atacou o ex-líder do PS, apontando “uma proximidade clara” a Marques Mendes, dizendo ser “difícil saber o que pensa sobre vários temas” e alertando que “a escolha do mal menor só tem feito o mal maior crescer”. Jorge Pinto, que já tinha colado Seguro a Mendes e também a Gouveia e Melo, disse ainda que dormirá descansado se “defender os interesses dos portugueses” e voltou a avisar para “uma golpada à Constituição como ameaça real”.
Quanto ao perfil presidencial, ambos foram pouco concretos. Catarina rejeitou entrar no “jogo partidário”, criticou Marcelo por transformar Orçamentos em moções de censura e escolheu o combate ao abandono como causa central. Jorge Pinto disse querer ser um Presidente de mobilização, no terreno, “mas sem levar a comunicação social”..
Nas avaliações do Observador há um empate e três vitórias para Jorge Pinto. E na classificação geral, a um debate do fim, Marques Mendes estará em campo mas tem a liderança.
Ana Sanlez— O debate arrancou com aquela que deve ser a questão na cabeça de muitos eleitores: qual é a diferença entre estes dois candidatos? Catarina Martins e Jorge Pinto não tiveram grande sucesso a dar-lhe resposta. São, mesmo, dois candidatos que podem apelar ao mesmíssimo eleitorado, jovem, urbano e cool. O ponto extra para Jorge Pinto fica justificado aqui: esforçou-se um bocadinho mais para se distinguir de Catarina Martins, nomeadamente na questão europeia, que incompreensivelmente dominou meio debate.
Quando questionados sobre a outra dúvida que perpassa a mente de muitos eleitores (à esquerda), que é a não desistência a favor de uma única candidatura agregadora à esquerda (de Seguro), Catarina Martins conseguiu ser um pouco mais enfática, pelo menos com uma frase forte: “A escolha do mal menor só tem feito o mal maior crescer”. Jorge Pinto foi mais seco, ao dizer que a “principal razão para votar em alguém não pode ser quem está melhor nas sondagens”. Podia ter-se esforçado mais aqui.
Ainda assim nenhum dos dois foi tão iludido como António Filipe no debate deste sábado com Seguro, quando disse, sem se engasgar, que acredita numa passagem à segunda volta. No geral foi um debate com pouco interesse, em que até o moderador parece ter ficado sem perguntas, já que nenhum dos dois candidatos cumpriu os 15 minutos que tinha para debater.
Filomena Martins — O debate começou logo com um sinal claro: Catarina Martins entrou sem responder à primeira pergunta: “Quais as duas principais diferenças entre o que defende e o que defende Jorge Pinto?”. A cassete estava afinada e assim permaneceu durante boa parte do confronto. Também não respondeu a Jorge Pinto quando este a confrontou diretamente com a ideia de que o projeto europeu seria um “projeto condenado” — uma frase que lhe ficou colada desde debates anteriores.
Curiosamente, foi Jorge Pinto quem acabou por fazer a defesa mais clara da União Europeia. Crítica, sim, mas convicta. Insistiu que o futuro de Portugal passa por estar dentro das instituições europeias, disputando-as, liderando-as, e transformando a UE num polo de paz, democracia e transição ecológica. Catarina Martins procurou recentrar o debate na pergunta “que Europa queremos?”, sublinhando igualdade de género, direitos sociais e criticando o financiamento europeu à guerra em Gaza, bem como a ausência de referendos europeus em Portugal. Mas nunca dissipou totalmente a ambiguidade sobre o seu europeísmo.
O momento mais tenso surgiu quando Jorge Pinto voltou a lembrar que Catarina Martins defendera um referendo de saída da UE no contexto do Brexit. Catarina respondeu, negando qualquer simpatia por esses movimentos e esclarecendo que falava apenas do tratado orçamental. Ainda assim, ficou a sensação de que o eurodeputado do Livre foi mais consistente na defesa do espaço europeu, inclusive quando falou de defesa comum e maior integração, enquanto eurodeputada do Bloco preferiu uma autonomia estratégica face aos EUA, alargando parcerias.
Ambos evitaram sistematicamente a pergunta central do debate: o voto útil em António José Seguro. Quando confrontados com a possibilidade de desistência para impedir uma segunda volta entre dois candidatos de direita, Catarina fugiu à resposta e Jorge Pinto respondeu com consciência pessoal e fidelidade à sua candidatura. Nenhum quis assumir custos políticos.
Na questão de fundo — se é essencial um Presidente de esquerda — Jorge Pinto foi claro: num país já inclinado à direita, ter também um PR de direita é um erro estrutural, sobretudo num contexto de eventual revisão constitucional. Catarina voltou à luta pelas ideias, às pensões, à saúde e à necessidade de “chegar a Belém”, mas sem resolver o dilema da fragmentação.
Quando se falou da noite de 18 para 19 (de janeiro) e da possibilidade de passarem dois homens de direita, Catarina voltou a evitar a resposta. Jorge Pinto, pelo contrário, assumiu o risco e reiterou o dever de continuar, lembrando a “golpada” da revisão constitucional sem debate público.
No fim, ficou um contraste nítido: Catarina Martins trouxe causas, indignação e denúncia; Jorge Pinto trouxe coerência europeia e desenho institucional. Ambos falaram para o seu eleitorado. Nenhum falou para resolver o problema central da esquerda. E, mais uma vez, o silêncio sobre o voto útil disse tanto como qualquer discurso.
Luís Rosa — Não sei o que é pior. Se é ver Catarina Martins de sorriso rasgadíssimo — algo que os telespectadores dispensavam porque o sorriso não é, definitivamente, Pepsodent. Se é constatar a sonsice política da ex-líder do Bloco de Esquerda sobre a União Europeia, quando o partido liderado por si chegou a sugerir a saída do Euro. Ou se é recordar a demagogia típica do Bloco quando Catarina Martins proclama que, a partir de agora, as “nossas gerações vão passar a trabalhar sempre com contrato a prazo” — como se a reforma laboral proposta pelo Governo proibisse as empresas de contratarem jovens ou menos jovens para o quadro. Só isto faria com que desse a vitória a Jorge Pinto — porque, apesar do seu ódio primário a Pedro Passos Coelho, pareceu menos de esquerda radical. Não é grande coisa. Mas é a possível face a um debate tão fraquinho.
O que não faz com que Jorge Pinto não sofra do mesmo vírus de fantasia que caracteriza a extrema-esquerda. Insiste em falar no fantasma de uma revisão constitucional feita única e exclusivamente à direita como se isso fosse uma possibilidade real — e não é, porque o PSD já deixou claro que isso não é um tema. E agora tem uma nova bandeira (que também é rejeitada pela maioria dos portugueses): a regionalização.
Na única pergunta direta sobre os poderes presidenciais — qual seria a sua interpretação de um Presidente interventivo — os dois demonstraram que serão líderes da oposição em Belém, enquanto a direita estiver no poder. O sectarismo não aconselha o voto dos moderados — graças a Deus, a esmagadora maioria da população — e explica a baixíssima indicação de voto que têm em todas as sondagens: em termos de média, os dois valem 9,58%, segundo o Radar das Sondagens do Observador. Assim continuarão depois deste debate.
Miguel Viterbo Dias — Cumpriu sem deslumbrar. Catarina Martins e Jorge Pinto, lá no fundo – e nem é preciso ir muito fundo –, têm mais pontos que os unem do que os separem. Depois de ter fugido à resposta sobre quais as principais diferenças entre ambos, Catarina Martins lá disse que “não vale a pena encontrar diferenças onde não existem”, contradizendo-se quanto pouco antes tinha dito que seria durante o frente a frente que se iriam perceber os principais antagonismos. Nunca se chegou verdadeiramente a perceber.
Foram mais as críticas que se ouviram a nomes como Maria Luís Albuquerque, Luís Marques Mendes e António José Seguro do que propriamente pontos negativos apontados entre os dois protagonistas da noite, com exceção das questões europeias.
Jorge Pinto até respondeu bem ao apelo de Manuel Alegre sobre uma união à esquerda – recordando quando o histórico socialista disputou umas presidenciais contra Mário Soares, dividindo também o PS –, mas, e daí a negativa a ambos, está claro pelas sondagens que nenhum destes dois candidatos tem hipóteses palpáveis de passar à segunda volta e se é assim tão importante para a esquerda ter um candidato a disputar o lugar de Presidente da República, então a realidade impõe-se perante o sonho que ambos alimentam.
O candidato apoiado pelo Livre nem sequer colocou Seguro na lista de candidatos à esquerda, colocando nesse lote Gouveia e Melo e considerou que “ter pontos de convergência com a esquerda é bom”. Bom até pode ser, só que ainda não é suficiente para criar uma candidatura que aponte à vitória.
Recorde aqui:
o debate entre António José Seguro e António Filipe
o debate entre Cotrim Figueiredo e André Ventura
o debate entre António José Seguro e Cotrim Figueiredo
o debate entre Gouveia e Melo e André Ventura
o debate entre António Filipe e André Ventura
o debate entre Marques Mendes e Catarina Martins
o debate entre André Ventura e Jorge Pinto
o debate entre António Filipe e Catarina Martins
o debate entre António José Seguro e Catarina Martins
o debate entre Catarina Martins e Cotrim Figueiredo
o debate entre António José Seguro e Marques Mendes
o debate entre António Filipe e Gouveia e Melo
o debate entre António José Seguro e Jorge Pinto
o debate entre Cotrim Figueiredo e António Filipe
o debate entre Luís Marques Mendes e Jorge Pinto
o debate entre André Ventura e Catarina Martins
o debate entre Jorge Pinto e Gouveia e Melo
o debate entre Marques Mendes e André Ventura
o debate entre Cotrim Figueiredo e Jorge Pinto
o debate entre Catarina Martins e Gouveia e Melo
o debate entre Gouveia e Melo e Cotrim Figueiredo
o debate entre André Ventura e António José Seguro
o debate entre Marques Mendes e António Filipe