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(A) :: Notas. No último debate de ambos, Cotrim, o candidato do Príncipe Real, usou o tom de Ventura, o do País real, mas ganhou à justa

Notas. No último debate de ambos, Cotrim, o candidato do Príncipe Real, usou o tom de Ventura, o do País real, mas ganhou à justa

Em pleno acordo e em tom cordial, ambos atacaram Marques Mendes por não ter ainda revelado tudo dos seus clientes. Mas depois o liberal atacou com o tom habitual do líder do Chega, e o debate aqueceu.

Observador
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Seguimos ao minuto o debate neste artigo em direto

O último debate entre João Cotrim Figueiredo e André Ventura começou em tom cortês, com ambos em concordância sobre o ausente mais presente no estúdio: Marques Mendes e a polémica em torno da divulgação dos clientes da sua empresa familiar. O tom subiu à medida que o confronto avançou, passando da lei da nacionalidade à Europa — com Trump, Ucrânia, Nato e uma “catadupa” de temas do líder do Chega — e acabou num lodaçal político, com José Sócrates “arremessado” por ambos os lados, Ventura a falar no “candidato do Príncipe Real versus o candidato do País real” e Cotrim a colá-lo às “elites”, a Trump e a Putin e a atacá-lo com os casos de pedofilia no partido e o de Órban.

Na primeira parte, centrada no ataque a Marques Mendes, ambos garantiram ter uma vida financeira transparente, com declarações públicas e consultáveis. Cotrim manteve a pressão e defendeu que Mendes devia divulgar a lista de clientes como advogado: “Era bom que o fizesse, mas é com ele”, acrescentando que “quem pede a confiança dos eleitores tem de ser confiável”. Ventura foi mais duro: “Marques Mendes é o candidato menos transparente de todos”.

A primeira “bicada” surgiu quando Ventura questionou por que razão Cotrim não suspendia o mandato de eurodeputado. Apesar de o liberal explicar que isso não é possível no Parlamento Europeu, Ventura insistiu e deu o próprio exemplo: “Eu já pedi a suspensão e, como vou à segunda volta, quero ficar dedicado à campanha.” O tema regressou mais tarde, com um ataque direto: “O maior erro da vida do João foi deixar a liderança da IL para ir ter uma reforma dourada em Bruxelas, sem defender Portugal.” Cotrim respondeu: “Tenho uma reforma dourada tão boa que decidi candidatar-me a Presidente da República.”

Sobre a Lei da Nacionalidade, Cotrim recuou e afirmou que “esta lei tem de ser aperfeiçoada e aprovada”, garantindo que “não insistiria na alteração do Código Penal”. “Ou decidimos continuar numa birra, ou corrigimos a lei para que seja aprovada rapidamente”, explicou. Ventura preferiu expor o que considerou serem contradições do liberal, sem ouvir a explicação. O mesmo padrão repetiu-se no debate sobre as relações entre os EUA e a União Europeia, onde a discussão começou a descambar. Cotrim colou Ventura a Trump; o líder do Chega respondeu que reconhecer “um problema de imigração e criminalidade na Europa” nada tem a ver com o presidente norte-americano e que discorda de muitas das suas posições. Cotrim insistiu que “pertencemos à União Europeia” e avisou que, “se os Estados Unidos continuarem na sua senda isolacionista e se a Europa não se reformar, não se salvará”. Foi então que Ventura lançou uma “catadupa” de temas, da agricultura e do Mercosul à NATO, Ucrânia e Putin.

Já num registo abertamente confrontacional, e com Cotrim Figueiredp a devolver a André Ventura o seu tom e provocações habituais, mal o líder do Chega falou do “debate do candidato do Príncipe Real versus o candidato do País real”, o liberal respondeu colando-o às “elites”, lembrando o seu percurso como inspetor tributário e como advogado de defesa de Lalanda de Castro, ex-patrão de José Sócrates. Cotrim chegou a afirmar que Ventura tinha votado no ex-primeiro-ministro, hoje em julgamento. Ventura negou. Cotrim pediu desculpa. E Ventura contra-atacou: disse ter “muito orgulho” no seu percurso na Função Pública (onde há muitos votos) e acusou Cotrim de ter “despedido Manuela Moura Guedes da TVI a mando de Sócrates”. “Isso é mentira, isso é mentira!”, respondeu Cotrim, explicando que se incompatibilizou com os acionistas. Quis também um pedido de desculpas — que não chegou.

Os avaliadores do Observador dividiram-se. Há duas vitórias de Cotrim, uma de Ventura e um empate. 0,25 de diferença apenas entre ambos.

Um painel de avaliadores do Observador dá notas de 1 a 20 a cada um dos candidatos por cada um dos 28 debates televisivos para as eleições presidenciais e um texto de avaliação ao próprio confronto. A média vai surgindo a cada dia de debates, no gráfico inicial, que abre este artigo. Este sábado enfrentam-se, na TVI, António José Seguro e António Filipe (como sempre, às 21h00). Pode ver o calendário completo dos debates televisivos aqui. O debate das rádios terá lugar dia 2 de janeiro às 10h30.

Cotrim Figueiredo, 12 – André Ventura, 11,75

Alexandra Machado — Luís Marques Mendes foi o perdedor do debate de dois candidatos que se esforçaram por promover a sua própria transparência (André Ventura terá ficado, no entanto, aquém). Um início que acabou a unir os dois debatentes face ao ausente.

No resto do debate mostraram estar a lutar por uma franja comum no campo da lei da nacionalidade ou ainda nos jovens. No frente a frente de André Ventura e João Cotrim Figueiredo houve altos e baixos de cada um dos candidatos. Cotrim voltou a perder no capítulo da lei da nacionalidade, mas arrasou Ventura (que mostrou, mesmo, incómodo) na sua posição em relação a Donald Trump e à posição do Presidente dos Estados Unidos em relação à Europa e também na defesa do acordo UE-Mercosul e o impacto para os agricultores. André Ventura que agora se coloca em bicos de pés na defesa dos agricultores, dos funcionários públicos, nos pensionistas diz o que estas franjas querem ouvir, não necessariamente o que é melhor para elas. Ventura tentou em vários temas virar sempre para a imigração, como noutros debates virava sempre para a corrupção. É a sua tática e, pelas sondagens, dá resultado.

Mas neste debate com Cotrim acabou a (não) falar do que não queria. O pior ainda estava para vir. O debate terminou mal. Com Ventura a puxar pelo rolo compressor, que viu Cotrim vestir a pele que normalmente é do líder do Chega. Não lhe ficou bem, nem tem jeito para isso. Correu-lhe mal. Já a Ventura ficou-lhe bem o pedido de suspensão da atividade como deputado. Este foi o último debate destes dois candidatos. Era mais importante para Cotrim do que para Ventura. E para fazer a diferença tinha de ter corrido muito melhor ao candidato liberal.

Filomena Martins — O debate começou num tom elevado, quase institucional, e terminou mergulhado numa fricção excessiva, com um final desnecessariamente incendiário. Foi um confronto vivo, duro, com bons momentos de clareza política, mas perdeu-se no fecho, sobretudo quando se misturaram referências laterais — da saída de Manuela Moura Guedes da TVI a alusões a Orbán e a casos extremos — que pouco ou nada acrescentaram à substância.

No tema da transparência patrimonial, curiosamente, houve mais convergência do que parecia. Ventura insistiu na necessidade de explicar aumentos significativos de património, defendendo que quem se candidata deve clarificar financiadores, apoios e percursos económicos. Cotrim respondeu com o argumento da exposição pessoal: declarações públicas, livro publicado, percurso conhecido. Marques Mendes acabou por ser o saco de boxe comum, elevado à categoria de “pior do sistema”, numa definição fria e quase assassina de Ventura, sem grande resistência do outro lado.

Sobre a suspensão de mandatos, Cotrim foi técnico: essa figura não existe no estatuto de deputado europeu. Ventura respondeu politicamente, dizendo já ter pedido a suspensão e estar à espera, usando o tema como sinal de coerência pessoal — mesmo sabendo que o gesto vale mais simbolicamente do que juridicamente.

Na lei da nacionalidade, o debate aqueceu a sério. Cotrim defendeu a lei como absolutamente necessária, responsabilizando o PS pela situação criada com o fim do SEF e a introdução da manifestação de interesse. Rejeitou um braço de ferro com o Tribunal Constitucional e defendeu negociação política, rápida e eficaz. Ventura foi mais duro: não abdica da expulsão de criminosos e acusou o adversário de incoerência histórica, recordando posições passadas mais permissivas. Divergiram no essencial: Cotrim aceita a perda de nacionalidade apenas em crimes contra o Estado; Ventura invocou exemplos como a Dinamarca, hoje com critérios mais apertados, e defendeu mão pesada. Não o disse explicitamente, mas ficou claro que o Chega não tem problemas em prolongar o confronto com o Tribunal Constitucional — algo que, aliás, satisfaz a sua base de apoio.

Na Europa e relação com os EUA, Cotrim aproveitou para defender o projeto europeu e criticar Trump como fator de desintegração. Explicou bem os ganhos europeus no acordo com o Mercosul. Ventura declarou apoiar UE, euro e NATO, mas atacou esse acordo por o considerar lesivo para os agricultores europeus e avançou, finalmente, para o seu terreno preferido: o confronto pessoal. A passagem de Cotrim por Bruxelas foi rotulada como “reforma dourada”. Houve bons momentos retóricos a partir daí, mesmo que violentos e pessoais. E foi nesse plano que Ventura apanhou Cotrim: no passado disse não querer estar na política aos 70 anos; candidata-se à Presidência aos 65. Como diria Guterres, é só fazer as contas.

Em síntese, um debate intenso, com clivagens claras em imigração, nacionalidade e Europa, argumentos relevantes de parte a parte, mas prejudicado por um final demasiado crispado, onde o ruído acabou por se sobrepor à política.

Pedro Jorge Castro — O muito humilde André Ventura acusou João Cotrim de Figueiredo de estar a candidatar-se à Presidência da República por questões de ego. Aconteceu mesmo em direto na SIC.

O líder do Chega também gastou uma bala para denunciar a grave contradição de o eurodeputado seu adversário ter dito algures, quando deixou a liderança da Iniciativa Liberal, que não ia querer fazer política aos 70 anos. Momento de fact-check de investigação crucial para se compreender o debate: segundo a wikipedia, João Cotrim de Figueiredo nasceu a 24 de junho de 1961. Tem 64 anos. Se porventura (perdão) fosse eleito Chefe de Estado, terminaria o primeiro mandato com 69 anos. É isto que explica uma das mais inusitadas tiradas de todos estes debates: “Em que mês tomo posse? Se a sua dúvida é tão estúpida, dou uma resposta estúpida”. Também aconteceu mesmo.

Quando estiverem a rever o debate à procura dos melhores excertos para as suas redes sociais, talvez Cotrim deixe de fora a confusão entre a lei da nacionalidade e a lei dos estrangeiros, mais os ataques aos alegados pedófilos do Chega (para quê?), e a acusação a Ventura de ter votado Sócrates; e talvez Ventura não escolha o ataque ao acordo na agricultura com o Mercosul e a fuga a comentar Trump e votações na Europa ao lado de Putin. Talvez ambos escolham excertos em que atacam Marques Mendes, adversário de ambos.

Ventura quis começar em pose presidencial, mas só durou meio debate nisso, voltando ao seu registo mais clássico de disparar uma torrente de acusações. Cotrim conseguiu não se baralhar e rebater algumas de forma eficaz, em temas complexos. Noutros temas, não foi bonito de se ver. Mas o ex-presidente da IL ainda teve energia para acabar o debate a falar para a câmara, a vincar que o líder da oposição não quer ser Presidente.

Ricardo Conceição — Entre o “o João é o candidato do Príncipe Real e eu sou o do país real” e o “Reformar, homem!” ou acusações mútuas de favores a Sócrates, este foi um debate demasiado vivo, por vezes rasteiro, em que Ventura metralhou Cotrim Figueiredo e o liberal (mais uma vez) não foi muito hábil a esquivar-se e a contra-atacar. Os dois oponentes trataram-se ora por tu e ora por você. Variou em função da intensidade das “caneladas”. Ambos protagonizaram um espetáculo televisivo, que acabou por não dignificar a política.

A Ventura não lhe importa se é ou não verdade o que diz. Quer e é eficaz a comunicar o que lhe interessa, seguindo um apurado instinto para ganhar votos. Cotrim Figueiredo deixou-se enredar em explicações complicadas, ficou nas cordas a desferir golpes no ar. Mas, no final, conseguiu acertar e, eventualmente, causar alguma mossa. Olhou para a câmara e explicou aos eleitores do Chega, que André Ventura não deverá vencer a segunda volta e acabarão por ficar com um presidente em que nunca votariam.

Cotrim encontrou uma forma de se transformar em proposta de voto útil. Seguindo o critério de sempre: “Quem ganhou e quantos votos?” Ventura não perdeu e Cotrim Figueiredo também não. Porém, como próprio lembrou, o líder do Chega está em primeiro nas sondagens e o eurodeputado navega na incerteza de números díspares. Ventura sai melhor deste debate do que Cotrim Figueiredo.

Recorde aqui:

o debate entre António José Seguro e Cotrim Figueiredo

debate entre Gouveia e Melo e André Ventura

debate entre António Filipe e André Ventura

debate entre Marques Mendes e Catarina Martins

debate entre André Ventura e Jorge Pinto

debate entre António Filipe e Catarina Martins

debate entre Gouveia e Melo e Marques Mendes

debate entre António Filipe e Jorge Pinto

o debate entre Cotrim Figueiredo e Marques Mendes

debate entre António José Seguro e Catarina Martins

debate entre Catarina Martins e Cotrim Figueiredo

debate entre António José Seguro e Marques Mendes

debate entre António Filipe e Gouveia e Melo

debate entre António José Seguro e Jorge Pinto

debate entre Cotrim Figueiredo e António Filipe

debate entre Luís Marques Mendes e Jorge Pinto

debate entre André Ventura e Catarina Martins

debate entre Jorge Pinto e Gouveia e Melo

debate entre Marques Mendes e André Ventura

debate entre Cotrim Figueiredo e Jorge Pinto

debate entre Catarina Martins e Gouveia e Melo

debate entre Gouveia e Melo e Cotrim Figueiredo

debate entre André Ventura e António José Seguro

o debate entre Marques Mendes e António Filipe