Seguimos ao minuto o debate neste artigo em direto

André Ventura abriu o debate com Henrique Gouveia e Melo a falar de ciganos, a propósito de um processo judicial que o leva a tribunal esta terça-feira. Só depois respondeu à pergunta inicial sobre a sondagem desta segunda-feira, que o coloca na frente, em empate técnico, com Marques Mendes e Gouveia e Melo na primeira volta, mas derrotado por qualquer adversário na segunda. “O meu discurso é Portugal e dar um murro na mesa. Na segunda volta serão todos contra mim. Não troco convicções por votos. O PSD vai apoiar Gouveia e Melo, o PS vai apoiar Marques Mendes. Isto prova que são todos contra mim”, afirmou.
Gouveia e Melo voltou a apresentar-se como o único candidato “apartidário”, dizendo que o seu partido é “Portugal” e que o objetivo é “unir todo o espectro político”. Para se definir, recuperou uma frase dita no programa de Ricardo Araújo Pereira: “Há momentos em que temos de marchar mais com uma perna à direita e outros com uma perna à esquerda”, explicando que isso não é incoerência, mas estar “verdadeiramente ao centro”, defendendo “uma economia mais liberal, mas que cause coesão social”.
Ventura atacou essa posição, lembrando que o almirante aponta Mário Soares como referência, enquanto a sua é Ramalho Eanes, e trouxe para o debate o apoio de José Sócrates a Gouveia e Melo. “Não sei se o almirante sabia, mas, para impedir que eu ganhe, Sócrates disse que o apoiava, porque sabe que comigo vai para a prisão.” Acusou-o ainda de querer “agradar a toda a gente” e de “estar em cima do muro”. Gouveia e Melo respondeu com ironia: “Se Sócrates acordar um dia e disser que lhe dá apoio, o que é que faz? Faz um harakiri?”
O almoço entre ambos, com o patrocínio de Mário Ferreira, teria de ser tema. Gouveia e Melo garantiu que nunca aceitou “o apoio do Chega”, sublinhando que “o dr. André Ventura é importante no espectro político, lidera o segundo partido mais votado, não é uma pessoa perigosa”. Acrescentou que “não foi um almoço secreto, foi um almoço privado”. Ventura contrapôs, dizendo até que já tomou café no Conselho de Estado com Marques Mendes e se cruzou com Seguro, para concluir que, “a partir do momento em que Henrique Gouveia e Melo passou a ser o candidato do Partido Socialista — o PS tem dois candidatos —, eu e o Chega deixámos de o apoiar. Foi uma possibilidade. Deixou de o ser”.
A discussão sobre a lei da nacionalidade foi uma das mais tensas do debate. Ventura mostrou-se indignado com a decisão do Tribunal Constitucional: “Não podemos retirar a nacionalidade a quem a obtém e comete crimes? É um disparate e um erro que vamos pagar caro. Alguém obtém a nacionalidade de forma fraudulenta e não a podemos tirar? Quem cospe na bandeira não pode ser português.” Defendeu ainda que, “ao fim de dez anos, alguém que vem do Bangladesh não é igual a um português” e questionou se, nessas condições, “pode ser Presidente da República”.
Gouveia e Melo respondeu num tom mais pedagógico: “A partir do momento em que um estrangeiro obtém a nacionalidade, é português”, lembrando que um cidadão português que comete crimes também não perde a nacionalidade e sublinhando o princípio da igualdade perante a lei.
Sobre alterações à Constituição, Ventura foi taxativo: quer mudanças profundas, incluindo a introdução de novos crimes — voltou a referir a castração química para pedófilos — e acusou os apoiantes de Gouveia e Melo de quererem controlar a Justiça. O almirante respondeu que “não sou eu” e que há apenas um artigo que considera intocável: “o 288, o dos limites materiais da Constituição”.
Apesar de não haver unanimidade entre os avaliadores do Observador, a vitória foi para André Ventura.
Um painel de avaliadores do Observador dá notas de 1 a 20 a cada um dos candidatos por cada um dos 28 debates televisivos para as eleições presidenciais e um texto de avaliação ao próprio confronto. A média vai surgindo a cada dia de debates, no gráfico inicial, que abre este artigo. Amanhã, terça-feira, na RTP, realiza-se o debate em atraso entre António José Seguro e Cotrim Figueiredo (como todos os restantes, às 21h00). Pode ver o calendário completo dos debates televisivos aqui. O debate das rádios terá lugar dia 2 de janeiro às 10h30.
Gouveia e Melo, 12,75 – André Ventura, 13,5

Filomena Martins — Foi um debate duro, identitário e politicamente assimétrico. André Ventura venceu, impondo agenda, ritmo e emoção. Henrique Gouveia e Melo não foi atropelado: saiu inteiro, com uma linha clara e coerente, mas passou grande parte do tempo em posição defensiva, a justificar o que dizia. O confronto teve um vencedor — e teve também um sobrevivente.
O tema central foi a Constituição e a nacionalidade, no dia em que o Tribunal Constitucional vetou alguns artigos que levarão o diploma de volta ao Parlamento. Ventura insistiu na revisão constitucional para permitir a retirada da nacionalidade a criminosos graves, recorrendo a exemplos europeus e a uma retórica de rutura: “Quem cospe na bandeira não pode ser português”. Empurrou o debate para o campo identitário, onde se sente mais confortável, e tentou encostar Gouveia e Melo ao “sistema” e ao bloqueio político.
Gouveia e Melo foi inflexível num ponto: a Constituição cumpre-se enquanto estiver em vigor. Admitiu revisões, até apenas com partidos de direita, desde que respeitados os limites materiais (artigo 288.º), e repetiu o argumento jurídico que Ventura tentou contornar: não há portugueses de primeira e de segunda. Um violador português não perde a nacionalidade; um naturalizado também não. Foi consistente, rigoroso. Perdeu na emoção, ganhou no entendimento de um Estado.
A sondagem da Universidade Católica serviu de combustível político a Ventura, que se apresentou como presença garantida na segunda volta, mesmo, eventualmente, perdendo-a: “Se todos estão contra mim, estou no caminho certo”. Gouveia e Melo desvalorizou, disse confiar apenas no dia das eleições e reforçou o perfil de candidato sem partido, agregador, num mundo instável e num Parlamento fragmentado.
Na história e nos símbolos, Ventura contrapôs Eanes a Mário Soares, atacou o legado socialista e trouxe Sócrates para o ringue. Gouveia e Melo respondeu com equilíbrio: reconheceu virtudes e erros em ambos, reivindicou a sua condição de retornado e militar e recusou lições de patriotismo.
O almoço entre ambos foi explicado sem drama por Gouveia e Melo — conhecer um ator político relevante. Ventura confirmou o encontro, mas usou-o para dizer que dialoga com todos os candidatos (até falou de um café com Marques Mendes e um eventual encontro com Seguro) e que quis saber o que pensava o candidato Gouveia e Melo. O que ouviu não lhe agradou – e por isso avançou.
Conclusão: Ventura ganhou o debate ao empurrar Gouveia e Melo para a aceitação de uma revisão constitucional e para o “murro na mesa”; Gouveia e Melo perdeu em agressividade, mas preservou o perfil presidencial.
A Constituição foi, afinal, o verdadeiro campo de batalha, e saiu deste frente a frente como um documento que pode ser modificado. Sem surpresa por Ventura. Sendo notícia por Gouveia e Melo.
Miguel Santos Carrapatoso — A melhor versão de Henrique Gouveia e Melo não foi, ainda assim, suficiente para derrotar André Ventura. Apesar de tudo, o almirante conseguiu fazer duas ou três coisas que ainda não tinha conseguido fazer nesta maratona de debates: voltar a assumir-se como o candidato do centro (“Se cortarmos parte do país, vamos com metade da força” é uma mensagem particularmente bem conseguida); recuperar a imagem de autoridade que tinha antes de ser testado neste tipo de formatos (foi inteligente na forma como usou o facto de ser retornado e militar contra um adversário que diz falar em nome da bandeira nacional, desses mesmos retornados e dos antigos combatentes); e foi também bastante seguro na forma como aguentou as provocações de Ventura sobre o PS e sobre a associação (abusiva) a José Sócrates.
No entanto, no dia em que o prato forte era o chumbo da Lei da Nacionalidade, André Ventura não só foi bastante eficaz na defesa da sua narrativa sobre imigração, como conseguiu explorar as hesitações evidentes de Henrique Gouveia e Melo nesta questão.
No mais, e como cada debate conta uma história diferente, o almirante conseguiu superar as baixas expectativas que existiam sobre ele depois de muitos debates mal conseguidos: para quem achava que não iria aguentar os 12 assaltos contra Ventura, Gouveia e Melo provou que as notícias da sua morte enquanto candidato presidencial são manifestamente exageradas.
Pedro Jorge Castro — Depois de um misterioso almoço entre o almirante e André Ventura, apadrinhado por Mário Ferreira (quando o líder do Chega ainda não era candidato), reencontraram-se os dois à hora do jantar para este estranhamente civilizado menu de degustação:
Entradas a murro:
André Ventura a prometer um murro na mesa, embalado pela sondagem do dia que o coloca à frente. Mas iria fazer de propósito para não partir a loiça.
Prato que não é carne nem é peixe:
Gouveia e Melo a dizer que o país tem de marchar à esquerda e à direita e a manifestar admiração em simultâneo por Soares e Eanes. Ventura a elogiar Eanes (que foi reeleito em 1981 com o apoio do PCP), a rasgar Soares (reeleito em 1991 com o apoio do PSD), e a acusar o Almirante de querer ficar em cima do muro.
Prego à Ventura:
“Sócrates sabe que se eu ganhar ele vai para a prisão”, promete o líder do Chega, como se pudesse ter qualquer interferência no julgamento.
Tira-sabores:
“Esqueça lá o Bangladesh”, pediu o Almirante. E muito se falou de cuspir na bandeira.
Sobremesa com consistência de molotof:
Ventura levou Gouveia e Melo a dizer que admitia mudar a constituição.
Contas:
Ainda não se sabe quem fica nos dois primeiros lugares no dia 18 de janeiro, mas Ventura entrou num debate pela primeira vez a fazer contas à segunda volta, na esperança de conseguir captar algum eleitorado do almirante, se ele ficar para trás — e por isso esforçou-se para não o hostilizar (nem grelhar). Dificilmente dará para ganhar, segundo todas as sondagens, mas é diferente perder uma segunda volta com 20 ou com 40%. Foi o debate em que o almirante esteve menos mal, impôs-se aqui e ali, mas mesmo assim talvez tenha sido pouco assertivo, claro e mobilizador — para cativar um número suficiente de indecisos que terá deixado escapar.
Ricardo Conceição — Gouveia e Melo tinha de vencer este debate e conseguiu-o. Depois das fracas prestações iniciais, o candidato, que se diz suprapartidário, foi mais sereno, eficaz e conseguiu defender-se de vários ataques de André Ventura e até, desferir golpes certeiros.
Por seu lado, o líder do Chega e candidato presidencial recorreu a todo o seu arsenal, incluindo as referências a José Sócrates e a Isaltino Morais, mas nenhum “torpedo” causou danos significativos. Ventura ainda ensaiou uma pose de estadista ao alegar que não quer andar “às turras”, que até conversa com os adversários. No entanto, esse momento de construtor de pontes durou menos do que o tempo que leva a ler esta frase. E não se saiu bem do facto de ter almoçado com Gouveia e Melo num momento em que ponderava apoiar o almirante.
Já Gouveia e Melo foi frontal ao abordar a questão e saiu por cima. Ambos lutam pelo mesmo eleitorado e sabem que só um poderá passar à segunda volta. Olhando para a capacidade de amealhar votos num debate, é possível que um indeciso, entre os dois, tenha visto em Gouveia e Melo um candidato mais confiável.
Mas este debate poderá ter um segundo vencedor, Marques Mendes. O terceiro elemento da corrida poderá ter conseguido chegar a muitos indecisos ou mesmo a potenciais eleitores de Ventura e Gouveia e Melo. Mendes ganha no voto útil de quem não quer arriscar ter estes dois candidatos na segunda volta.
Recorde aqui:
o debate entre António Filipe e André Ventura
o debate entre Marques Mendes e Catarina Martins
o debate entre André Ventura e Jorge Pinto
o debate entre António Filipe e Catarina Martins
o debate entre António José Seguro e Catarina Martins
o debate entre Catarina Martins e Cotrim Figueiredo
o debate entre António José Seguro e Marques Mendes
o debate entre António Filipe e Gouveia e Melo
o debate entre António José Seguro e Jorge Pinto
o debate entre Cotrim Figueiredo e António Filipe
o debate entre Luís Marques Mendes e Jorge Pinto
o debate entre André Ventura e Catarina Martins
o debate entre Jorge Pinto e Gouveia e Melo
o debate entre Marques Mendes e André Ventura
o debate entre Cotrim Figueiredo e Jorge Pinto
o debate entre Catarina Martins e Gouveia e Melo
o debate entre Gouveia e Melo e Cotrim Figueiredo