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(A) :: As notas dos debates. António Filipe voltou a pôr todos no mesmo saco, e o Diabo que escolha, e Catarina aproveitou

As notas dos debates. António Filipe voltou a pôr todos no mesmo saco, e o Diabo que escolha, e Catarina aproveitou

Falaram da greve geral, da lei laboral, dos direitos dos trabalhadores, do que os une e até da proibição de redes sociais. Mas o "venha o Diabo e escolha" entre Putin e Zelensky tramou António Filipe.

Observador
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Seguimos ao minuto o debate neste artigo em direto

O tema de abertura, na véspera de uma greve geral, não podia ser outro: a própria greve e o que a motivou — a nova lei laboral. António Filipe começou por “saudar os trabalhadores” e afirmar que levaria “ao limite os seus poderes” caso fosse eleito Presidente. Disse ainda esperar que “o próximo Presidente já não tenha de intervir”, porque acredita que o Governo olhará para a enorme adesão à greve geral — são essas as informações que tem — e “retire a proposta”. Mas, se tal não acontecer, garantiu que “pediria a fiscalização de normas ao Tribunal Constitucional”.

Catarina Martins voltou a evocar Mário Soares e o apoio que este deu, enquanto Presidente, a uma greve geral em 1988. E acrescentou: “Deve ter sido por isso que Cavaco Silva lhe chamou força de bloqueio”. Por isso mesmo, comparou-se ao histórico líder socialista: “Se força de bloqueio é quem defende os trabalhadores contra um Governo que lhes quer tirar direitos”, então ela também o será. “Porque isso não é bloquear o país, é desbloquear o país”.

Depois de um tema que os unia, veio outro que os afastou: porquê tantas candidaturas à esquerda e não uma de convergência? António Filipe lembrou que “avançou quando não havia outras candidaturas na sua área” e que, depois de Seguro ter avançado, “era uma evidência que ia ser o candidato do PS”. Para ele, portanto, não havia “Messias” que pudesse congregar a esquerda. No caso da bloquista, e ao contrário do que afirmou sobre Jorge Pinto — disse tratar-se de uma candidata de “esquerda sem mas”, no entanto “não favorece a convergência, isso é um dado objetivo”.

A candidata apoiada pelo Bloco explicou que avançou mais tarde precisamente porque esperou “uma candidatura independente, que agregasse vários espaços partidários, como Sampaio da Nóvoa, e que permitisse essa convergência”. Mas, “como isso não foi possível”, avançou, sabendo que tem “apoios para lá” da sua “área política de origem”. E lembrou o caso de Maria de Belém, que começou com 15% e terminou abaixo dos 5%: “Como uma candidatura pode ir para baixo, também pode ir para cima”, acredita.

Depois de discutirem ainda dissoluções e o tipo de Presidentes que seriam, a maior divisão surgiu novamente sobre a guerra na Ucrânia. António Filipe voltou a ser demolidor para com o Presidente ucraniano: “Sou absolutamente agnóstico em relação às lideranças. Trump tem uma liderança absolutamente errática e o que quer é vender armas à Europa. Entre Putin e Zelensky, venha o Diabo e escolha. Estamos entre elites corruptas”. Quando questionado sobre por que motivo identificava agressor e agredido na Palestina, mas não fazia o mesmo na Ucrânia, respondeu com o argumento de que as Nações Unidas consideram “os israelitas colonizadores” e acusou a União Europeia de usar “dois pesos e duas medidas em relação à Palestina e à Ucrânia”.

Catarina Martins apenas concordou na parte palestiniana: “Tenho sido muito vocal contra estes dois pesos e duas medidas na causa palestiniana”. Mas, sobre a Ucrânia, mostrou enorme divergência: “O facto de um governo não ser um bom governo não se resolve invadindo. Portugal teve uma ditadura durante 48 anos e uma guerra colonial, e ninguém de esquerda pediu que Portugal fosse invadido. Seria absurdo. Independentemente do que se pense de Zelensky, a Ucrânia tem direito à sua independência e a defender-se”. António Filipe ainda balbuciou: “Mas com certeza, também condenei a invasão. A soberania deve ser mantida”, mas já ninguém ouviu.

A concórdia regressou na questão da Venezuela, mas apenas na ideia de que Corina Machado não merecia o Nobel — porque “defendeu a invasão do seu país por Donald Trump”, disse Catarina Martins, ou porque “os primeiros telefonemas que fez depois de receber o prémio foram para Trump e Netanyahu, e está tudo dito”, repetiu António Filipe. Já que apenas a bloquista criticou Maduro, o comunista optou por ignorar o nome.

A conversa terminou com ambos a comentarem a proibição de redes sociais para menores de 16 anos na Austrália.

Um painel de avaliadores do Observador dá notas de 1 a 20 a cada um dos candidatos por cada um dos 28 debates televisivos para as eleições presidenciais e um texto de avaliação ao próprio confronto. A média vai surgindo a cada dia de debates, no gráfico inicial, que abre este artigo. Amanhã, quinta-feira, dia de greve geral, na SIC, André Ventura enfrenta Jorge Pinto (como todos os restantes, às 21h00). Pode ver o calendário completo dos debates aqui.

Catarina Martins, 8,5 — António Filipe, 7,25

Filomena Martins — Foi um debate sereno, quase fraterno, entre dois candidatos que partilham ADN político e diagnóstico social. Catarina Martins e António Filipe encontraram-se na mesma gramática — trabalhadores, Constituição, justiça fragilizada — e, por isso mesmo, o resultado ia num empate claro: sólidos, coerentes, mas sem grande espaço para surpreender. Até que, mais uma vez, o comunista tropeçou na invasão da Ucrânia. O clássico.

O arranque foi marcado pela greve geral. António Filipe saudou os trabalhadores e chamou-lhe “luta pela democracia”, prometendo levar o veto presidencial ao limite e até pedir fiscalização preventiva ao Tribunal Constitucional. Catarina Martins recuperou Mário Soares em 1988 para defender o direito à greve e criticou a proposta laboral como um retrocesso que pode tirar até 900 euros anuais a quem vive na precariedade. Para ambos, o Governo tem de retirar a lei e apresentar outra.

O arranque foi marcado pela greve geral. António Filipe saudou os trabalhadores, chamou à paralisação “luta pela democracia” e prometeu levar o veto presidencial ao limite e até pedir fiscalização preventiva no Tribunal Constitucional. Catarina Martins recuperou Mário Soares em 1988 para defender o direito à greve e criticou a proposta laboral como um retrocesso capaz de tirar até 900 euros anuais a quem vive na precariedade. Para ambos, o Governo deve retirar a lei e apresentar outra — de preferência, desta vez, uma que não provoque uma greve geral.

Seguiu-se o salário mínimo. Catarina acusou Montenegro de prometer valores “em modo de gozo”; António Filipe sublinhou que nem as confederações patronais levaram o anúncio a sério. A concordância foi total: salários baixos, país bloqueado e urgência de um Presidente que não aceite “este cenário de degradação social”. Uma espécie de manifesto conjunto não declarado.

No plano político, houve elegância e distanciamento: António Filipe admitiu que a multiplicação de candidaturas à esquerda dificulta a convergência, mas recusou qualquer apelo à desistência. Catarina defendeu o valor de uma candidatura independente, com apoios que ultrapassam o BE e piscando o olho aos socialistas que não estão com Seguro, ora recordando Soares ora elogiando Guterres. Sobre sondagens, ambos fizeram o que se esperava — falar de campanha, não de aritmética.

No plano político, houve elegância e distanciamento. António Filipe admitiu que a proliferação de candidaturas à esquerda dificulta a convergência, mas rejeitou qualquer ideia de desistências. Catarina defendeu o valor de uma candidatura independente, com apoios que ultrapassam o BE — e piscou um olho assumido aos socialistas que não estão com Seguro, evocando Soares e elogiando Guterres. Nas sondagens, fizeram o que se esperava — falar de campanha, não de aritmética.

Quanto ao papel presidencial, separaram-se, mas só um bocadinho. Catarina criticou Marcelo pelas dissoluções e pela chantagem em torno dos orçamentos, propondo um Presidente mais atento à vida real — obstetrícia, idosos abandonados, serviços públicos a desmoronar. António Filipe respondeu com o manual constitucional na mão: um Presidente cumpridor, vigilante e pronto a usar os seus poderes para proteger direitos e serviços públicos.

Na política externa, alinharam na Palestina, mas o comunista desalinhou — outra vez — na Ucrânia. Em Gaza, ambos falaram dos dois pesos e duas medidas da comunidade internacional. Na Ucrânia, a conversa derrapou para a crítica à subordinação europeia aos jogos de Trump e Putin. Mas António Filipe foi mais longe, afinando a cassete: “Entre Putin e Zelensky, venha o Diabo e escolha”, disparou. Catarina não deixou passar: explicou-lhe que “o facto de um governo não ser um bom governo não se resolve invadindo o país” e que, “independentemente do que se pense de Zelensky, a Ucrânia tem direito à sua independência e a defender-se”. O comunista ainda balbuciou qualquer coisa sobre soberania, mas o momento já tinha passado.

Sobre a Venezuela, ela criticou Maduro; ele fingiu que não ouviu. Já quanto ao Nobel entregue a Corina Machado, concordaram com uma contundência rara: não se dá um prémio da paz a quem pede a Trump uma invasão. Fecharam o debate a falar de redes sociais, onde ambos defenderam o combate ao anonimato abusivo e a proteção de menores.

Foi um debate moderado, com clarificações, mas sem rutura. Dois candidatos diferentes na forma, próximos no fundo. Mas para o PCP, há sempre a Ucrânia.

Miguel Santos Carrapatoso — Tentou, tentou e tentou. Mas não conseguiu. Carlos Daniel, o moderador do debate, procurou que Catarina Martins e António Filipe debatessem efetivamente um com o outro, se distinguissem e justificassem o sentido do voto. Foi um esforço inglório. Não é um eufemismo; Carlos Daniel chegou mesmo a dizer o seguinte: “Os senhores estão a debater um com o outro”. Sem sucesso. Razões para serem duas alternativas a Seguro: António Filipe diz que chegou primeiro porque nunca acreditou em Messias; Catarina Martins diz que chegou depois porque esperou por um independente que nunca veio. E adiante.

Foi preciso chegar a Kiev para assistir a uma vaga tentativa de um e outro marcarem diferenças. Mas também aí foi tudo uma grande confusão. Catarina Martins quer a paz na Ucrânia, reprova o plano de Trump, que diz ser uma marionete de Putin. Ao mesmo tempo, diz que a União Europeia, que tem tentado rejeitar os termos propostos por Washington e alegadamente cozinhados com Moscovo, se tem comportado como um “capacho” dos Estados Unidos. Fica muito difícil compreender.

António Filipe, ao menos, resolveu tudo com uma grande facilidade: “Entre Putin e Zelensky, venha o diabo e escolha”. E não se fala mais nisso. A bloquista lá fez um esgar de reprovação e disse que “o facto de um governo ser mau governo não se resolve invadindo o país”. Vá lá, ao menos isso. No resto, Catarina Martins esteve ligeiramente mais enérgica e mais articulada. Começou com um elogio a Mário Soares e acabou com um elogio a António Guterres. Admitindo que haja algum eleitor do PS que pense em votar em Catarina Martins, ficaram estas duas palavras de conforto. A frase vencedora, essa, foi a de Carlos Daniel: “As sondagens, ou estão todas erradas, ou nenhum de vocês está em condições de passar à segunda volta”.

Miguel Viterbo Dias — O debate de António Filipe e Catarina Martins resume-se com a falta de respostas à pergunta: o que é que os distingue? Não fosse uma interjeição de Catarina Martins quando António Filipe voltou a equiparar Zelensky a Vladimir Putin e este frente a frente tinha sido um lado a lado.

No pacote laboral, concordância total. Dois candidatos presidenciais transformados em deputados da oposição a apelarem a uma mobilização nas ruas que faça o Governo recuar. A única semelhança com os poderes presidenciais é que, tal como a greve, as conversas entre o Chefe de Estado e o primeiro-ministro também decorrem às quintas feiras.

Na parte política, em que, aí sim havia a possibilidade de clarificar porque é que dois partidos que nas últimas legislativas não conseguiram chegar à bitola dos 5% dos votos (essencial para garantir financiamento público numas presidenciais), decidiram ir a jogo. Acabou por se confirmar o cenário mais óbvio: é mais o que os une do que aquilo que os separa.

António Filipe não teve outra hipótese que não admitir que o número de candidatos à esquerda não favorece a convergência e Catarina Martins rapidamente colocou as culpas na autonomia do PCP para justificar a falta de um candidato de unidade à esquerda. Mas, sobre diferenças nas grandes questões para o país, nada a assinalar.

Assim sendo, resta o de sempre: a posição isolada do PCP e de António Filipe quanto à situação na Ucrânia em que Catarina Martins conquista a vitória com o óbvio: “Mesmo os que são perseguidos por Zelensky querem combater Putin”. Quanto a tudo o resto, afinal, parece que há bases para a esquerda convergir.

Ricardo Conceição — E no fim ganhou o Benfica, que derrotou o Nápoles. Sim. estou a falar do debate desta noite entre António Filipe e Catarina Martins, que confirmou as expectativas de desinteresse. O espetáculo na Luz foi mais interessante. Mas vamos ao debate. Como sempre, tentando responder à pergunta “quem ganhou votos?” A resposta é, necessariamente, ninguém. Porém, também não perderam. Nem no momento em que foi dada a oportunidade de estabelecer diferenças, os candidatos aproveitaram para uma estocada leve para mostrar o que os separa.

Catarina Martins é melhor a comunicar e isso permitiu-lhe sair por cima na grande kryptonite dos comunistas, a Ucrânia. Foi certeira e rápida ao afirmar que “Portugal teve uma ditadura durante 48 anos, tinha uma guerra colonial, seguramente ninguém de esquerda pediu para Portugal ser invadido”.

Já de António Filipe, sobre este tópico, ficou apenas esta tirada: “Entre Putin e Zelensky venha o diabo e escolha”. Um debate sem história, em que ninguém tirou votos a ninguém nem conseguiu ir além da própria base de apoio. No entanto, Catarina Martins esteve um ponto acima do oponente.

E no fim, ganhou o Benfica.

Recorde aqui:

o debate entre Gouveia e Melo e Marques Mendes

debate entre António Filipe e Jorge Pinto

o debate entre Cotrim Figueiredo e Marques Mendes

debate entre António José Seguro e Catarina Martins

debate entre Catarina Martins e Cotrim Figueiredo

debate entre António José Seguro e Marques Mendes

debate entre António Filipe e Gouveia e Melo

debate entre António José Seguro e Jorge Pinto

debate entre Cotrim Figueiredo e António Filipe

debate entre Luís Marques Mendes e Jorge Pinto

debate entre André Ventura e Catarina Martins

debate entre Jorge Pinto e Gouveia e Melo

debate entre Marques Mendes e André Ventura

debate entre Cotrim Figueiredo e Jorge Pinto

debate entre Catarina Martins e Gouveia e Melo

debate entre Gouveia e Melo e Cotrim Figueiredo

debate entre André Ventura e António José Seguro

o debate entre Marques Mendes e António Filipe