Um político caído em desgraça e agora ostracizado pelo Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), ao qual pertenceu durante décadas. Desde esta segunda-feira em prisão preventiva por ordem do Supremo Tribunal de Espanha, Santos Cerdán está a tornar-se num dos maiores problemas para o governo espanhol, após ter vindo a público a trama de corrupção em que alegadamente está envolvido. Pedro Sánchez está numa posição cada vez mais frágil e sofre ataques em todas as frentes. Os partidos que suportam o seu governo no Congresso dos Deputados estão a reconsiderar se mantêm ou não o apoio à solução governativa. Há socialistas descontentes. E a direita espanhola deverá avançar com uma moção de censura, ganhando pelo meio força nas sondagens.
Santos Cerdán foi o número três do PSOE e durante os últimos anos um dos maiores aliados políticos do chefe do governo espanhol. Nascido em maio de 1969 na comunidade de Navarra, oriundo de famílias socialistas, o político caído em desgraça ocupou, desde o final dos anos 90, vários cargos políticos na região em que nasceu. Apenas ganhou destaque e passou para a cena nacional com a liderança de Pedro Sánchez, que o foi promovendo a cargos de relevo, principalmente dentro do partido.
Tendo em conta a proximidade entre os dois, o caso de corrupção em que Santos Cerdán está envolvido afeta inevitavelmente a imagem de Pedro Sánchez, que já garantiu não ter nada a ver com a trama em que está implicado o seu antigo aliado. O socialista de Navarra é acusado de liderar uma “alegada organização criminosa”, num esquema que se desenvolvia no Ministério dos Transportes sob o nariz do líder do governo. Santos Cerdán é suspeito da prática de suborno, associação criminosa e tráfico de influências.
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Em termos políticos, Santos Cerdán era considerado por muitos socialistas como o “arquiteto do sanchismo”. Nos bastidores, o político nascido em Navarra ajudou Pedro Sánchez a manter-se no poder na sequência das eleições gerais de julho de 2023, em que o PSOE ficou em segundo lugar, e o Partido Popular (PP), liderado por Alberto Núñez Feijóo, venceu. Foi Cerdán quem negociou diretamente com o líder do Junts per Catalunya, Carles Puigdemont, para que este desse apoio ao atual executivo.
Num espaço de poucos dias, Santos Cerdán deixou de ser uma figura influente no PSOE e converteu-se em persona non grata ao ser detido e depois transferido para a prisão Soto del Real, esta segunda-feira. Os socialistas fiéis a Pedro Sánchez tentam controlar os danos, distanciando-se do caso — e garantindo que o chefe do executivo foi também iludido por aquele que foi durante anos o seu aliado e braço-direito. A porta-voz do governo, Pilar Alegría, assumiu esta terça-feira que a imagem de ver o socialista a ser detido foi “profundamente dececionante e dolorosa”.
Santos Cerdán. O homem de Navarra caído em desgraça e que era um “extraordinário negociador”
Milagro. Foi nesta pequena vila, no sul de Navarra, que Santos Cerdán nasceu. Aquela localidade rural é um bastião socialista e os seus pais eram apoiantes do PSOE. Os primeiros tempos foram passados num colégio religioso em Lodosa, em regime de internato. A irmã, Belén Cerdán, contou ao El Mundo que a família queria dar-lhe “mais oportunidades”.

Quando chegou à altura de ir para a universidade, Santos Cerdán decidiu não frequentar o ensino superior e tirar o equivalente a um curso profissional na área da eletrónica industrial. Depois, trabalhou em várias empresas agroalimentares na região da Navarra. A política só entrou na sua vida aos 30 anos; em 1999, afiliou-se no PSOE. Naquele ano, tornou-se vereador na autarquia de Milagro, cargo que ocupou durante 16 anos (com uma pausa de quatro anos pelo meio). Nesta altura, estava afastado de Madrid e era apenas um membro da base socialista.
Em 2014, Santos Cerdán assumiu funções no Parlamento de Navarra, em substituição de um deputado regional que abandonara a carreira política. Foi eleito para o mesmo cargo um ano depois, mas apenas permaneceu até 2017. Nesse ano, ia dar o salto para a política nacional. No cargo desde 2014, Pedro Sánchez tinha-se demitido do cargo de secretário-geral e provocara novas eleições diretas no PSOE. Foi nesta altura que o atual chefe do governo espanhol passou a confiar em Santos Cerdán, atribuindo-lhe o cargo de recolher assinaturas de apoio à sua candidatura.
Pedro Sánchez acabou por ganhar as primárias no PSOE em 2017 e a aliança com Santos Cerdán consolidou-se. Quando o chefe do governo espanhol chegou ao Palácio da Moncloa um ano depois, o secretário-geral dos socialistas continuou a contar com o seu aliado não só para as questões partidárias, como também para assuntos governativos. O político de Navarra era um dos mais próximos do líder espanhol e ajudava a delinear o rumo dos socialistas.
Tanto assim é que, na sequência das eleições gerais de 2019, Santos Cerdán foi recompensado: foi eleito para o Congresso dos Deputados. Após o impasse que se viveu na política espanhola, o socialista terá ajudado a forjar a aliança entre o Unidas Podemos e o PSOE. Ao defender-se no Supremo Tribunal esta segunda-feira, como apuraram os órgãos de comunicação social espanhóis, Santos Cerdán afirmou mesmo que foi “o arquiteto para conseguir os governos progressistas em Espanha”.
Dito de outro modo, Santos Cerdán assumiu que desempenhou um papel fundamental para que Pedro Sánchez se tornasse presidente do governo espanhol e para montar as coligações que permitiram ao atual secretário-geral do PSOE chegar ao poder. “Só trabalhei para fazer governos de coligação neste país”, disse no Supremo Tribunal. O socialista de Navarra admitiu que ajudou a garantir uma maioria no Congresso para que o governo de Mariano Rajoy caísse em 2018, iniciando conversações com o Partido Nacionalista Basco (PNV) — que hoje é um dos parceiros que sustentam a coligação de Pedro Sánchez — e obtendo o seu apoio para aprovar a moção de censura contra o ex-presidente do governo espanhol.
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Depois da aliança entre Unidas Podemos e PSOE se solidificar, em 2020, Santos Cerdán acumulou o cargo de deputado com o presidente da fundação Pablo Iglesias — o fundador do PSOE (que não está relacionado com o também fundador do Unidas Podemos, com o mesmo nome). A associação tem como finalidade “difundir o pensamento socialista e fomentar o conhecimento da história”. Saiu do cargo dois anos depois. Entretanto, já se tinha tornado secretário de Organização dos socialistas, onde mantinha, como escreve La Sexta, um “low profile, ainda que essencial na estrutura socialista”.

Esse perfil veio a ser essencial em 2023 para Pedro Sánchez se manter no poder. Santos Cerdán foi um dos principais responsáveis pela aliança que surgiu no Congresso dos Deputados espanhol após as últimas eleições. Foi uma espécie de intermediário com os partidos regionalistas — desde os bascos aos catalães. Aliás, o socialista de Navarra negociou diretamente com Carles Puigdemont, na Suíça, para que o Junts per Catalunya desse novamente o seu aval à solução governativa.
Santos Cerdán terá sido um dos principais impulsionadores da lei da amnistia (recentemente validada pelo Tribunal Constitucional espanhol), a moeda de troca que Carles Puigdemont utilizou para viabilizar o executivo de Pedro Sánchez. Com isto, o separatista catalão pode ver-se livre do processo judicial resultante do referendo sobre a independência da Catalunha, em outubro de 2017. Ao Supremo Tribunal, Santos Cerdán admitiu que aquela lei era “essencial para conseguir a investidura de Pedro Sánchez”.
Para além de Carles Puigdemont e do apoio do Junts per Catalunya, Santos Cerdán também desempenhou um papel ao negociar junto do Partido Nacionalista Basco (com o qual já tinha trabalhado em 2018) e o Eh Bildu, a coligação de esquerda independentista com ligações à ETA. O homem que foi durante anos apenas vereador em Milagro converteu-se naquele que manteve Pedro Sánchez no poder.

Era o homem de confiança do chefe do governo espanhol durante os últimos anos. Numa entrevista em dezembro de 2023 à Rádio Catalã, um mês após a investidura bem-sucedida, Pedro Sánchez deixava rasgados elogios a Santos Cerdán. “É um bom socialista, um grande secretário da Organização, um extraordinário negociador e muito eficaz como os resultados mostram. Uma pessoa que me acompanhou desde sempre. Tem toda a minha confiança e é um dos colaboradores mais próximos.”
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Como era a rede de corrupção e a garantia de Santos Cerdán: “Não recebi nem um euro”
O discreto negociador “extraordinário” transformou-se num ativo tóxico para os socialistas. As declarações de María Jesús Montero, ministra das Finanças e vice-presidente do governo espanhol, provam a repulsa e o ostracismo que Santos Cerdán provocam ao PSOE. “É um assunto de uma pessoa que não tem a ver com o Partido Socialista”, assegurou a governante, que prometeu que os socialistas estão a “colaborar com a Justiça”. “O Ministério Público terá o seu motivo. Vamos respeitar a Justiça.”
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Esta é a linha da narrativa do núcleo duro de Pedro Sánchez: não negam e lamentam os alegados atos ilícitos de Santos Cerdán, mas asseguram duas coisas: a primeira é que não tinham conhecimento e não estão envolvidos na alegada rede de corrupção e a segunda é que agiram “com contundência” e rapidez. Em Sevilha, durante a Conferência sobre Desenvolvimento, o chefe do governo evitou fazer juízos de valor sobre aquele que descreveu em dezembro de 2023 como um “bom socialista”.
Em vez disso, o líder do governo espanhol sublinhou que os socialistas “agiram com contundência e com respeito à Justiça, que será aquela que terá de dirimir a responsabilidade do senhor Cerdán”. “O PSOE agiu, assumiu a responsabilidade política e afastou-se de Santos Cerdán”, assegurou Pedro Sánchez, que explicou que o seu antigo aliado deixou de ser deputado, demitiu-se do cargo de secretário de Organização dos socialistas e suspendeu a sua afiliação ao PSOE.
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Os socialistas tentam limitar o escândalo ao que agora chamam “triângulo tóxico”. Um dos vértices é Santos Cerdán, os outros dois são José Luis Ábalos, o ex-ministro dos Transportes, e o seu assessor, Koldo García. Aliás, esta polémica teve como origem outro caso — o caso Koldo. Durante a pandemia de Covid-19, aqueles dois homens são acusados de realizar contratos públicos milionários com uma empresa fantasma para a compra de máscaras.
https://observador.pt/especiais/milhoes-de-euros-em-mascaras-e-as-ligacoes-a-portugal-nove-respostas-sobre-koldo-o-caso-que-mancha-a-imagem-do-governo-de-sanchez/
A Unidade Central Operativa da Guarda Civil, a entidade responsável pela investigação, estava a apurar mais informações sobre o caso Koldo e sobre a alegada ilegalidade na adjudicações de contratos públicos à compra de máscaras. No meio da recolha de provas, foram encontrados áudios que denunciam outra alegada rede de corrupção da qual Santos Cerdán seria o cabecilha, num alegado conluio com José Luis Ábalos e Koldo García.
Gravados entre 2019 e 2023 (em particular no WhatsApp), os oito áudios provam alegadamente que Santos Cerdán tentava obter comissões ilegais em adjudicações de obras públicas com o apoio do Ministério dos Transportes, liderado por José Luis Ábalos. O procurador que lidera o Ministério Público Anticorrupção em Espanha, Alejandro Luzón, acusou Santos Cerdán de liderar uma organização “criminosa”.
As ligações entre os três homens terá começado em 2014, nas primárias socialistas que levaram Pedro Sánchez ao cargo de secretário-geral do PSOE e prosseguiu nos anos seguintes. “Santos Cerdán levou a corrupção ao Ministério” dos Transportes, afirmou Alejandro Luzón. O alvo foi escolhido com precisão, pois aquela pasta era a que dispunha de um “maior orçamento no Governo”. Mas era também naquele Ministério que havia dois aliados, que recolhiam dividendos: José Luis Ábalos e Koldo García.
No total, a Justiça espanhola determinou que, na sequência das alegadas adjudicações de obras públicas, os três homens lucraram 620 mil euros, ainda que cerca de 550 mil euros ainda não tenham sido distribuídos. No entanto, a imprensa espanhola já está a noticiar que os alegados benefícios podem chegar aos cinco milhões de euros.
Em concreto, a alegada rede que era liderada por Santos Cerdán favorecia supostamente certas empresas em determinados contratos públicos de milhões de euros, como para a construção de estradas ou vias ferroviárias. Essas empresas — como a Acciona, que terá sido uma das principais beneficiadas com este esquema, ou a Servinabar — pagariam depois comissões ilegais aos três homens.

A suposta rede tinha uma estrutura própria — a alegada liderança cabia a Santos Cerdán, bem como a distribuição dos dividendos. E não se ficava por aqui. O socialista de Navarra também pagou uma espécie de salário de 10 mil euros por mês — durante dois anos e meio — a Koldo García. O objetivo consistia em manter a “capacidade de influência” do ex-assessor dentro do governo.
Apesar das provas, Santos Cerdán rejeitou por completo as acusações. Levantou a hipótese de os áudios terem sido “manipulados” por adversários políticos, assegurando que nunca recebeu qualquer compensação financeira na sequência da celebração de contratos públicos. O ex-braço direito de Pedro Sánchez sugeriu que pode haver motivações políticas por trás deste caso. “Declaro-me inocente. Não recebi nem um euro. Nem tão-pouco o PSOE. O meu único delito foi ter trabalhado para que houvesse governos de esquerda em Espanha”, declarou na sua defesa no Supremo Tribunal.
Ainda assim, o juiz do Supremo Tribunal, Leopoldo Puente, ordenou que fosse aplicada a medida de coação de prisão preventiva a Santos Cerdán, realçando que poderia haver perigo de fuga do socialista e também para prevenir a destruição de provas. Em reação, os advogados que representam o antigo secretário de Organização dos socialistas anunciaram que vão pedir uma perícia para avaliar se os áudios são ou não manipulados.
Governo de Sánchez enfrenta uma nova crise, mas não deverá cair
O processo de corrupção relacionado com a sua mulher, Begoña Gómez (que motivou Pedro Sánchez a escrever uma “carta à cidadania” e a ameaçar demitir-se da presidência do governo espanhol). O caso Koldo. O possível envolvimento de um antigo aliado seu numa gigante trama de corrupção. No último ano, o executivo espanhol tem sido fustigado por vários problemas com a Justiça. Mesmo que não haja condenações ou que o PSOE tente desvincular-se, o dano político está feito.
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Entre todos, o mais complicado é, indiscutivelmente, o de Santos Cerdán. O antigo braço direito era um elemento bastante importante dentro do PSOE e as ligações a Pedro Sánchez são claras. Mesmo que o chefe do governo espanhol não tenha tido conhecimento da alegada trama de corrupção, poderá ter confiado nas pessoas erradas — e tê-las colocado em posições de relevo.
O secretário-geral dos socialistas pediu desculpa aos espanhóis, após ser conhecido o caso, em meados de junho. Pedro Sánchez salientou que seria feita uma “auditoria externa” às contas do PSOE. “Estava convencido da integridade de Santos Cerdán”, lamentou o líder do executivo de Espanha, que confessou sentir uma “profunda tristeza e uma enorme deceção” pelo que fez aquele que foi durante anos o seu principal aliado.
Porém, na altura em que pediu desculpa, Pedro Sánchez não contava com a prisão preventiva do seu ex-aliado. Ouvidos pelo El País, vários ministros confessam que é “uma imagem duríssima” ver Santos Cerdán atrás das grades. Em contrapartida, algumas fontes próximas da presidência do governo espanhol dizem ao mesmo jornal que “os danos estão feitos, é uma vergonha, mas não muda nada se vai ou não para a prisão”.
Os socialistas aguardam um mês de julho bastante duro, que terá reflexos na opinião pública. Mesmo antes da detenção de Santos Cerdán, uma sondagem publicada este domingo pelo El Mundo já revelava uma clara tendência de descida para o PSOE, que se ficava pelos 26,8% das intenções de voto. Em sentido inverso, o Partido Popular estava já a oito pontos de distância, nos 34,7%, com o Vox também a subir bastante.
Mesmo assim, os socialistas estão convencidos de que os seus parceiros de governo não lhes vão retirar o apoio. O presidente do Partido Popular (PP) deverá avançar com uma moção de censura contra o executivo de Pedro Sánchez e está, para o efeito, a tentar recolher apoios. O do Vox está garantido, mas é preciso que um dos atuais parceiros do PSOE no Congresso dos Deputados apoie a iniciativa dos partidos de direita.
A moção de censura estará, contudo, provavelmente destinada ao fracasso. Mesmo que deixem duras críticas à atuação do executivo de Pedro Sánchez, nenhum dos partidos regionalistas (PNV, Eh Bildu, Bloco Nacionalista Galego) ou à esquerda do PSOE (Unidas Podemos e Sumar) está disposto a deixar cair o governo e a perder a capacidade de influência. Há, contudo, uma exceção: o Junts per Catalunya. O partido de Carles Puigdemont é o único que mostrou disponibilidade para votar ao lado do PP e do Vox. Mas faz uma exigência: que os líderes do PP vão à Bélgica negociar diretamente.

Como assinalaram fontes do partido ao El Mundo, o PP “sabe quais são os mecanismos de Junts para ter conversas” para derrubar o governo, que têm de ocorrer fora de Espanha: “Não seremos menos exigentes com o PP do que com o PSOE na hora de aceitar as reuniões para estes assuntos”. Porém, por agora, os populares já recusaram ir à Bélgica negociar com Carles Puigdemont. “Não vamos fazer o que criticámos. Não somos como o Partido Socialista. Ninguém nos encontrará ali”, atirou Miguel Tellado, porta-voz do grupo parlamentar do PP.
Por agora, o governo de Pedro Sánchez parece resistir a este embate, a não ser que Carles Puigdemont lhe troque as voltas. Os recados dos parceiros governamentais são, ainda assim, duros. Por exemplo, Yolanda Díaz, vice-presidente do governo e fundadora do Sumar, garantiu esta segunda-feira estar “zangada” e que vai “pedir esclarecimentos”. Mas as sondagens mostram que a esquerda está, neste momento, em queda; e umas eleições antecipadas resultantes de uma moção de censura levariam à perda de deputados e a muita provável aliança entre o PP e o Vox. E ninguém quererá ariscar.
Também dentro do Partido Socialista há críticas. Fora do núcleo duro de Pedro Sánchez, muitos socialistas demonstram publicamente o seu desagrado com a trajetória do chefe do governo espanhol. Os críticos da atual liderança do PSOE aglutinam-se em torno da imagem de Emiliano García-Page, presidente da comunidade autónoma de Castilla-La Mancha, e que tem deixado duras críticas ao secretário-geral.

“Há gente em Espanha que pratica o vitimismo permanente”, atirou Emiliano García-Page, num ataque direcionado a Pedro Sánchez esta segunda-feira, recordando que Santos Cerdán e José Luis Ábalos foram “determinantes” na trajetória política do líder do governo espanhol. O presidente de Castilla-La Mancha já tinha declarado que não vê uma “saída digna” para o secretário-geral socialista e antevê que “falta muitíssimo para saber” no que concerne à corrupção que rodeia o núcleo duro de Pedro Sánchez.
A sucessão de crises a que o governo de Pedro Sánchez está sujeito está a beliscar a imagem do executivo. No entanto, os seus parceiros governamentais não estão dispostos a perder capacidade de influência junto do governo, ao mesmo tempo que queimam o chefe do executivo espanhol em lume brando e desgastam ainda mais a sua imagem. Apesar da vontade de chegar ao poder, a direita não tem margem de manobra para derrubar o executivo — apenas o poderia fazer com Carles Puigdemont, mas este apoio poderia revelar-se tóxico.
Por sua vez, Pedro Sánchez não dá sinais de se demitir, mesmo com todo este desgaste. O chefe do governo espanhol até admitiu recandidatar-se nas eleições gerais de 2027, recusando também eleições antecipadas. Mas é certo que o executivo está cada vez mais pressionado — e mesmo entre os socialistas, o coro de críticas está a aumentar.