“E se descobrem que sou uma fraude?” 8 perguntas e respostas sobre a síndrome do impostor
Há pessoas que acham que não são tão competentes como os outros julgam. Este medo de um dia serem descobertas pode ter um tremendo impacto na saúde mental e provoca sofrimento e ansiedade.
1 O que é a síndrome do impostor?
É o nome dado ao fenómeno psicológico de acreditar que se é incapaz ou incompetente, mas ainda ninguém descobriu. Mesmo perante a evidência concreta de valor, competência e sucesso — ou seja, o reconhecimento dos outros e a progressão profissional —, a pessoa sente-se uma fraude e teme que, mais cedo ou mais tarde, os outros vão acabar por perceber isso. Em alguns casos, esta perceção é generalizada a todas as áreas da vida, noutros, é um sentimento que está focado em áreas ou situações particulares, como a parentalidade ou o trabalho.
O termo foi usado na literatura científica pela primeira vez em 1978, pelas psicólogas norte-americanas Pauline Clance e Suzanne Imes.
2 Mas onde se traça a linha entre o normal e o problemático?
Todos sentimos inseguranças, incertezas e receio da avaliação dos outros em situações importantes ou desafiantes.
Tudo isto só é problemático, refere a psicóloga Tânia Daniela Carvalho, quando há uma grande “frequência, intensidade e persistência dos sentimentos de inadequação”, bem como “um impacto e sofrimento na vida da pessoa.”
Em termos práticos, trata-se da diferença entre ter estes sentimentos em situações pontuais, que sejam desafiantes – por exemplo, a apresentação de um projeto muito importante no trabalho – ou ter estes receios e sentimentos persistentemente, de modo “mais enraizado e crónico, apesar das evidências que provam o contrário, interferindo de forma negativa e prejudicial na vida da pessoa.”
3 Quais são os principais sintomas?
Quem se sente assim tem frequentemente um conjunto de crenças, pensamentos, sentimentos e comportamentos associados, explica Tânia Daniela Carvalho:
- Dúvida e tendência para auto-subestimação permanentes. Ou seja, a pessoa acredita que as conquistas que alcança não são devido às suas competências, mas sim devido à sorte ou circunstâncias externas;
- Medo constante que os outros percebam que não é tão competente quanto aparenta e de ser “desmascarado”, o que leva a uma tendência para evitar novos desafios com receio de falhar;
- Stress e ansiedade, face à pressão que sentem em provar o seu valor e o medo de serem descobertos;
- Perfeccionismo, já que estabelecem padrões extremamente elevados e, quando não se conseguem atingi-los, há uma sensação de fracasso;
- Comparações desfavoráveis com os outros: a pessoa acredita que toda a gente é mais capaz, competente e merecedora de sucesso.
4 A síndrome do impostor é uma doença mental?
Não. No entanto, pode ter um impacto significativo na saúde mental, sendo um fator, entre outros, que pode conduzir ao desenvolvimento ou agravamento de uma doença.
A título de exemplo, a psicóloga refere como efeitos negativos o aumento da ansiedade, o isolamento, a baixa-autoestima, o burnout e, em casos mais graves, quando a pessoa fica presa numa perceção negativa de si mesma, a depressão.
5 Quais são as causas deste fenómeno?
São quase sempre várias, sendo que há três que podem ser particularmente relevantes: “fatores psicológicos – como o perfeccionismo e a baixa autoestima – , familiares – como comparações e críticas na infância – e pressões sociais e culturais – como expectativas de sucesso e estereótipos de desempenho”, refere a psicóloga.
Por outro lado, frisa que as experiências passadas de fracasso ou trauma poderão desencadear ou agravar esse fenómeno.
6 Há outras características ou contextos que aumentem o risco?
De acordo com a psicóloga, os estudos que têm sido feitos sobre a síndrome do impostor mostram que tende a ser mais frequente em mulheres, sobretudo aquelas que trabalham em setores ainda dominados por homens, e que é mais prevalente entre jovens em início de carreira, associado aos receios que decorrem da falta de experiência.
Parece também ser mais prevalente “em profissões altamente competitivas e com uma constante avaliação ao nível do desempenho, por exemplo, no meio académico e nas áreas da tecnologia, artes, medicina ou ciências”, refere. Por outro lado, acredita-se que em sociedades que valorizam mais o sucesso individual e a competitividade, pode ser mais frequente, já que “existe mais ênfase em resultados individuais e em demonstrar competência.”
7 Quando é que se deve procurar ajuda?
“Quando este problema passa a ter um grande impacto no dia a da e no bem-estar da pessoa ou dos outros à sua volta”, diz Tânia Daniela Carvalho.
Ou seja, quando a pessoa começa a condicionar as suas escolhas pessoais ou profissionais com base neste medo ou quando começa a sentir os seus efeitos negativos, com o aumento da ansiedade ou baixa autoestima.
Nesta situações, é recomendável consultar um psicólogo, que pode ajudar a perceber as causas desta crença, a combater os sintomas e a desenvolver ferramentas para enfrentar a vida pessoal e profissional com outra confiança.
8 E há outras estratégias que se podem usar para lidar com isto?
Sim. Para além de recorrer à ajuda de um psicólogo, também se podem tentar estas abordagens, sugere Tânia Daniela Carvalho:
- Transformar o “diálogo interno”, passando de afirmações negativas e “ruminantes”, para um discurso mais ajustado e positivo. Por exemplo, substituir o pensamento “Tive sorte nesta prova, mas não vai ser sempre assim” por “Tive esta boa nota porque me empenhei e esforcei”;
- Reconhecer os pontos fortes e focar-se neles. Em vez de pensar constantemente no que corre mal ou não foi bem feito, saber olhar para as forças, talentos e potencialidades;
- Praticar a autocompaixão. Uma forma de fazer isso é pensar como se falaria com um amigo que estivesse a passar pela mesma situação;
- Reavaliar expectativas e definir metas alcançáveis: deixar de parte o perfeccionismo ou autocrítica excessiva, recordando que toda a gente comete erros e definir objetivos alcançáveis — em vez de ter metas idealizadas e abstratas.