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Governo de Montenegro entra em modo pré-campanha

Os ministros da AD foram convocados para as jornadas parlamentares de PSD e CDS e escreveram guião para uma eventual crise: a vitimização do Governo, a culpa de Pedro Nuno e a penalização que merece.

Miguel Santos Carrapatoso
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Um desfile de ministros, um dia inteiro a reclamar louros pelo que foi feito, a anunciar aquilo que está ou vai sair do papel e uma mensagem que começa a ganhar forma e que servirá de mote para a próxima campanha eleitoral – se e quando esta vier a acontecer: apesar da boa vontade, do empenho e dedicação do Governo, a Aliança Democrática foi impedida de governar por uma oposição que nunca se conformou com o resultado das últimas eleições legislativas.

Aconteça o que acontecer no Orçamento do Estado, a equipa de Luís Montenegro e de Nuno Melo está apostada em colocar em prática um plano que nunca deixou de estar completamente excluído nas cogitações do núcleo mais duro da Aliança Democrática: a possibilidade de ter mesmo de ir a votos numa fase ainda muito prematura da governação. Num elenco que foi pensado essencialmente para ser um Governo de combate, o objetivo declarado foi sempre transmitir a sensação de que se está a fazer muito e num curtíssimo espaço de tempo.

Ora, as jornadas parlamentares que arrancaram esta segunda-feira e que se estendem até amanhã, terça-feira, são bem demonstrativas dessa mesma estratégia: os (muitos) ministros que falaram elencaram os méritos dos respetivos Ministérios, projetaram o futuro das respetivas pastas e vincaram como seria mau para o país se o trabalho fosse interrompido. Ainda assim, e apesar do protagonismo assumido pelos governantes, seria Hugo Soares a definir um guião que, de uma forma ou de outra, iria ser repetido ao longo do dia — ele que, apesar de ser líder parlamentar, acaba por ser uma espécie de uma espécie de 18.º deste Governo.

Numa intervenção muito crítica em relação às posições negociais assumidas por Pedro Nuno Santos, Hugo Soares atirou em cheio ao secretário-geral socialista: “Apenas por capricho, ou por taticismo eleitoral e partidário, ou por falta de capacidade de pôr o interesse nacional acima de qualquer pequeno interesse ou interesse partidário, é que é possível imaginar [que não haja entendimento no Orçamento do Estado]”,.

De resto, e passando por cima dos aspetos técnicos das duas medidas mais controversas deste Orçamento – a redução transversal do IRC e o IRS Jovem –, Hugo Soares limitou o debate a uma ideia relativamente simples de vender numa futura campanha eleitoral e que fará o seu caminho junto do eleitorado que a Aliança Democrática quer fidelizar (de direita, mais jovem): uma divisão entre os que querem reduzir os impostos (PSD e CDS) e os que não o permitem (PS). “Que diabo, será assim tão difícil entendermo-nos quanto à baixa de impostos. Há alguém no país que não concorde com a redução de impostos?”, chegou a questionar o líder parlamentar.

O que separa verdadeiramente Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos é reduzir quanto, como e a quem os impostos. Apesar dessa importante nuance, Hugo Soares e outros depois dele não se cansaram de repetir a a mensagem, juntando duas ideias que servirão seguramente de arma de arremesso numa eventual campanha eleitoral: a culpabilização de Pedro Nuno Santos, o tal que andou “a enganar o país”, “criando a expectativa de que havia uma hipótese de negociar as duas medidas do programa do Governo”; e no apelo ao castigo do causador da crise. “Estou certo que nesse cenário os portugueses não deixariam de castigar tamanha irresponsabilidade política do PS”, acrescentaria Paulo Núncio, líder parlamentar do CDS.

Depois do arranque formal dos trabalhos, os ministros mais políticos da Aliança Democrática ensaiaram diferentes abordagens para chegar ao mesmo efeito pretendido, a fragilização de Pedro Nuno Santos. Pela irresponsabilidade que seria contribuir para a queda do Governo, como disse Nuno Melo; pela tática de colocar determinados segmentos da população (os mais velhos) contra outros segmentos (os mais jovens), como sugeriu António Leitão Amaro (“Nós não somos nem vamos ser um partido que só quer agradar a uma certa parte etária dos portugueses [os pensionistas] porque acha que aí tem um favoritismo eleitoral”) ou por desprezar a classe média por mera cegueira ideológica, como apontou Miguel Pinto Luz.

Intervenções sempre ou quase sempre temperadas com a ideia de urgência de evitar uma crise para agarrar o futuro (“Não há tempo a perder. Não abortem a descolagem do avião da economia portuguesa; deixem a economia portuguesa voar”, apelou Pedro Reis) e com o sentido de risco iminente de tudo colapsar (“Estamos num ambiente de enorme incerteza do ponto de vista internacional”), avisou Joaquim Miranda Sarmento. Tudo isto embrulhado na adaptação de uma frase celebrizada por Aníbal Cavaco Silva: “Deixem-nos governar. Se nos deixarem governar, nós construiremos um Portugal com certeza muito melhor”, pediu o mesmo Pinto Luz.

Não é difícil imaginar um discurso eleitoral assente nas ideias que os respetivos líderes parlamentares e os vários ministros foram repetindo ao longo do primeiro dia de jornadas. Se Pedro Nuno Santos vier a chumbar o Orçamento do Estado será prova de que nunca esteve verdadeiramente empenhado nas negociações, de que foi pouco razoável, irresponsável, mostrou desprezo pelos empresários, classe média e pelos mais jovens e de que, por tudo isto, merece ser penalizado nas urnas. Independente da confirmação ou não de uma crise política, o guião da Aliança Democrática já está escrito.

Hugo Soares e outros depois dele não se cansaram de repetir a a mensagem, juntando duas ideias que servirão seguramente de arma de arremesso numa eventual campanha eleitoral: a culpabilização de Pedro Nuno Santos, o tal que andou “a enganar o país”, “criando a expectativa de que havia uma hipótese de negociar as duas medidas do programa do Governo”; e no apelo ao castigo do causador da crise. “Estou certo que nesse cenário os portugueses não deixariam de castigar tamanha irresponsabilidade política do PS”, acrescentaria Paulo Núncio, líder parlamentar do CDS

Imigração, Pensões, Defesa, Habitação: AD tenta mostrar trabalho feito

Além do combate político propriamente dito, os ministros que se juntaram às jornadas parlamentares de PSD e CDS aproveitaram para mostrar aquilo que já fizeram ou estão a fazer nos respetivos Ministérios. À cabeça, e um dia depois de André Ventura ter organizado uma manifestação em defesa da  regulação da imigração, António Leitão Amaro defendeu que este Governo já está a corrigir a “asneira” que os sucessivos governos socialistas fizeram, anunciando o facto de os pedidos de residência terem diminuído em 80% desde a extinção da figura de manifestação de interesse.

“Não precisamos de dividir as pessoas entre os bons e maus, os nossos e os estranhos, os portugueses e os estrangeiros. E também aqui este governo propõe ao país um caminho diferente de todas as outras forças políticas. À nossa esquerda ainda não perceberam a asneira que fizeram quando durante anos. Transformaram Portugal num país de portas escancaradas. Mas Portugal precisa de trabalhadores imigrantes e precisa daqueles que verdadeiramente podem estar a fugir de situações de agressão humanitária”.

Também Nuno Melo se propôs a mostrar o trabalho feito. “Já se registaram, desde o anúncio das medidas do Governo, mais 300 candidaturas para o Exército do que em igual período no ano passado e a Força Aérea tem a convicção de que em 2024 terá muito mais candidatos do que em iguais períodos dos últimos dois anos”, anunciou o ministro da Defesa.

“Podemos dizer, com orgulho, que 115 dias depois da posse do nosso Governo, procedemos ao maior aumento combinado de salários, de suplementos, de apoios em casos de incapacidade ou morte em serviço que os militares não tinham – ao contrário do que acontece, por exemplo, com as forças de segurança – e de apoio aos antigos combatentes, com a compra de medicamentos, do tempo desta democracia em Portugal. Isto aconteceu com este Governo e com o Governo da Aliança Democrática.”

Se Melo garantiu que o atual Governo fez o maior investimento público de sempre na Defesa, Miguel Pinto Luz, das Infraestruturas e Habitação, puxou para o Executivo liderado por Luís Montenegro “o maior investimento jamais feito em Portugal em habitação pública”, um reforço de “2,8 mil milhões de euros para assegurar os 26 mil fogos e os restantes fogos que ficaram de fora do PRR” e que vai permitir garantir a construção de “59 mil fogos”.

Margarida Balseiro Lopes, da Juventude e da Modernização Administrativa, argumentou que este Governo, responsável por um investimento histórico na Juventude (“Nunca se investiu tanto na Juventude e nunca a Juventude foi uma prioridade tão grande como é para o XXIV Governo Constitucional”), já conseguiu, entre outras coisas, mobilizar mais de 1500 camas para os alunos do ensino superior.

Ana Paula Martins, na Saúde, prometeu margem orçamental para avançar com a construção de quatro novos hospitais em regime de Parcerias-Público Privadas (PPP) e um empenho digno dos “Dez trabalhos de Astérix” na redução dos tempos de espera nas cirurgias e consultas. Na Segurança Social e para os mais velhos, Maria do Rosário Ramalho anunciou novas regras de atualização das pensões. Joaquim Miranda Sarmento, o último ministro a intervir no primeiro dia de jornadas, deixou a promessa: tudo será alcançado com contas públicas saudáveis.